[PT-BR *English below] Tribunal superior do trabalho autoriza que funcionários com cargo de confiança sejam ouvidos como testemunhas em ações trabalhistas
- Baril Advogados

- 22 de out.
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Resumo: em entendimento recente, o Tribunal Superior do Trabalho fixou, em tese de Recursos Repetitivos (Tema 307), o entendimento de que funcionários que exercem função de cargos de confiança podem ser ouvidos como testemunhas em ações trabalhistas, prática que era pouco aceita nas varas do trabalho em virtude de maior possibilidade de parcialidade do funcionário com poderes diretivos.
A Importância e o Valor das Testemunhas para o Processo do Trabalho:
O processo do trabalho é regido por diversos princípios, entre eles, principalmente, o princípios da informalidade e da oralidade. Estes princípios são os que fomentam que o processo trabalhista corra de maneira mais rápida e simples, por meio de um procedimento de caráter menos formal e dando grande valor às provas produzidas oralmente.
A própria dinâmica das relações de trabalho não é totalmente compatível com o seguimento exclusivamente dos contratos e termos escritos, uma vez que a subordinação dos empregados ao poder diretivo do empregador por muitas vezes ultrapassa as dinâmicas previstas contratualmente.
Por isso, existe um enorme peso no depoimento pessoal das partes e na oitiva de testemunhas. As testemunhas normalmente são colegas, ou, em alguns casos, até mesmo clientes, que presenciaram de maneira recorrente a dinâmica existente na relação de emprego entre as partes do processo trabalhista. São, portanto, a principal prova (para a maioria das discussões) que uma parte pode produzir em seu benefício nas ações trabalhistas.
É evidente que dentro do próprio contexto das relações de trabalho podem ser encontrados fatores impeditivos para que determinadas pessoas sejam ouvidas como testemunhas. Quem é ouvido nessa condição presta um compromisso legal de dizer a verdade e tem sua palavra considerada como verdadeira, com o intuito de dar ao Juiz da causa os parâmetros da realidade do que ocorreu na relação de trabalho para que a causa seja julgada.
Por exemplo, empregados que são amigos íntimos entre si, familiares, amigos dos sócios, pessoas que tenham algum tipo de tendência a serem parciais para um dos lados do litígio, e não podem ser ouvidas como testemunhas, visto que são suspeitas ou impedidas, dependendo do caso.
Em decorrência disso surge a discussão que gerou o entendimento definido pelo Tribunal Superior do Trabalho: o empregado que exerce um cargo de confiança, aquele que se encontra em posição de gestão e direção, e possui poderes mais amplos de representação dentro da empresa, como contratar e demitir funcionários, gerenciá-los e administrar finanças, pode ou não pode ser ouvido como testemunha? É natural presumir a sua tendenciosidade em benefício do empregador?
Anterior Impossibilidade de Oitiva de Funcionários em Cargos de Confiança Como Testemunhas:
Até recentemente, existia uma praxe nos Tribunais Regionais do Trabalho que consistia em não ouvir empregados que exercem cargos de confiança como testemunhas nas ações, sob o argumento de que teriam uma tendência maior a ser parciais em benefício das empresas. Isto ocorria a despeito do entendimento das turmas do E. Tribunal Superior do Trabalho, que já proferia decisões de maneira pacífica no mesmo sentido do entendimento que foi formalizado como incidente de resolução de demandas repetitivas.
Realmente, é de se imaginar que o empregado que exerça um cargo de gestão e está mais próximo às altas personalidades diretivas ou mesmo dos próprios integrantes do quadro societário de uma empresa estejam mais suscetíveis a atuar em benefício da corporação em situações que trazem risco de impacto financeiro ao empregador.
Porém, tendo em vista que cada caso é único e cada empresa possui um caráter diferenciado das demais, com dinâmicas internas de cargos individualizadas, o entendimento generalizado de que o exercício de um cargo de confiança torna o empregado automaticamente suspeito como testemunha não parece ser razoável em relação à própria dinâmica do direito processual, que, desenvolvido a partir dos preceitos constitucionais, sempre fomenta a possibilidade de exercício do direito de defesa como elemento fundamental do acesso à justiça.
Entendimento Fixado Por Meio do Tema nº 307 do TST:
O Tribunal Superior do Trabalho fixou um entendimento que pode ser amplamente benéfico às empresas na construção de sua defesa nas ações judiciais trabalhistas, fomentando o atendimento aos princípios do contraditório e da ampla defesa previstos constitucionalmente.
Os ambientes corporativos comumente avaliam a justiça do trabalho com maus olhos, em virtude de seu caráter protecionista que visa defender os trabalhadores que são as partes mais frágeis dentro da dinâmica das relações de emprego. Em paralelo a isso, muitas vezes as defesas sofrem com a limitação na possibilidade de indicação de testemunhas, muito em virtude da presunção da tendenciosidade dos empregados que exercem cargos de gestão na empresa.
Porém, o Tema nº 307 do E. TST foi fixado de maneira contrária a essa dinâmica, o que pode se mostrar um avanço no acesso das empresas ao direito à defesa na esfera trabalhista. A ação judicial de nº 0010638-88.2024.5.03.0084, que foi selecionada como caso paradigma para a fixação do entendimento pela Corte Superior do Trabalho, assim definiu, por meio do acórdão publicado em 15/09/2025:
[...] ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – Acolher a proposta de afetação do processo para instauração do Incidente de Recurso Repetitivo com o fim de reafirmar a jurisprudência deste Tribunal, quanto à matéria, fixando a seguinte tese: O exercício do cargo de gerência ou de função de confiança não constitui causa de suspeição da testemunha, salvo quando houver ausência de isenção de ânimo para ser ouvida no processo ou quando a testemunha arrolada detiver poderes de mando e gestão equiparados aos do empregador. II – Conhecer do recurso de revista no tema objeto do representativo, por violação ao art. 447, § 3º, II, do CPC e, no mérito, dar-lhe provimento, aplicando a tese ora reafirmada para determinar o retorno dos autos à Corte de origem, a fim de que prossiga no exame do feito, como entender de direito, considerando, também, o teor do depoimento da testemunha arrolada pela parte reclamada. III – Determin ar o regular prosseguimento do feito, diante da ausência de temas remanescentes a serem apreciados por este Colendo TST.
Isto significa que, a partir de agora, os Tribunais Regionais devem passar a aplicar o entendimento fixado em tese de Recursos Repetitivos pelo Tribunal Superior do Trabalho, de maneira que, para que um empregado dotado de cargo de gestão seja considerado suspeito para depor como testemunha no processo, será imprescindível que ele tenha ausência de isenção de ânimo (ou seja, uma evidente parcialidade e tendenciosidade a depor de maneira benéfica ao empregador); ou que o empregado detenha poderes de mando e gestão equiparáveis aos do empregador (ou seja, diretores de níveis mais altos, cuja autonomia de tomadas de decisão e poderes de representação da empresa podem ser comparados ao dos próprios sócios).
A fixação deste entendimento por meio de tema de resolução de demandas repetitivas é uma forma pela qual o TST pode induzir os Tribunais Regionais a seguirem essa linha de julgamento, e os impactos da tese devem ser positivos no acesso ao direito de defesa pelos empregadores, que não estarão mais sujeitos a terem a sua defesa cerceada pela própria “regra do jogo”, visto que o depoimento do empregado gestor pode, muitas vezes, ser um fator determinante para nortear o Juiz da causa em seu julgamento.
Autor:
Rafael da Rocha Chueiri
Advogado Associado
Núcleo de Contencioso
Saiba mais em: https://www.bariladvogados.com.br/rafael
Referências
Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-Lei nº 5.452/1943. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm.
Código de Processo Civil. Lei nº 13.105/2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.
Íntegra do Acórdão do plenário do TST. Disponível em: https://pje.tst.jus.br/consultaprocessual/detalhe-processo/0010638-88.2024.5.03.0084/3#cefed1b.
MARQUEZINI, Ágatha e PIOVESAN, Bruna Maria: TST Decide Alterar uso de Testemunhas em Cargos de Confiança. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2025-out-10/tst-decide-alterar-uso-de-testemunhas-em-cargos-de-confianca/ - acesso em 21/10/2025.
[EN]
Superior labor court authorizes employees in positions of trust to testify in labor lawsuits
The Importance and Value of Witnesses in Labor Proceedings
Labor proceedings are governed by several principles, notably the principles of informality and orality. These principles ensure that labor cases are handled in a faster and simpler manner, through less formal procedures and with significant emphasis on oral evidence.
The dynamics of employment relationships are not entirely compatible with a system based solely on written contracts and documents, since the subordination of employees to their employer’s managerial authority often goes beyond what is expressly provided in contractual terms.
For this reason, great weight is given to the personal testimony of the parties and the statements of witnesses. Witnesses are usually co-workers or, in some cases, even clients who have directly observed the employment relationship between the parties involved. They therefore serve as the main form of evidence — in most disputes — that a party can present in its favor in labor lawsuits.
Naturally, within the context of employment relationships, certain factors may prevent specific individuals from serving as witnesses. Anyone heard in this capacity must take a legal oath to tell the truth, and their testimony is considered credible, providing the judge with the factual basis necessary to reach a fair decision.
For example, employees who are close friends or relatives of the parties, or individuals who have a clear tendency toward partiality, cannot serve as witnesses, as they are considered suspect or disqualified, depending on the case.
This issue gave rise to the debate that led to the TST’s decision: Can an employee holding a position of trust — that is, someone in a managerial or supervisory role with broader powers to represent the company, such as hiring and firing employees, managing personnel, or handling finances — serve as a witness? Is it reasonable to presume that such an employee would naturally be biased in favor of the employer?
The Previous Impossibility of Hearing Employees in Positions of Trust as Witnesses
Until recently, it was common practice in the Regional Labor Courts (Tribunais Regionais do Trabalho) to refuse testimony from employees in positions of trust, based on the assumption that they were more likely to be biased in favor of the employer. This occurred despite the fact that various panels of the TST had already issued consistent rulings allowing such testimony, which has now been formally consolidated through the repetitive demand resolution mechanism.
Indeed, one might assume that a managerial employee, being closer to the company’s leadership or even its shareholders, would be more inclined to act in the employer’s favor in situations involving financial risk to the company.
However, since each case is unique and each company operates under distinct internal structures, the generalized presumption that occupying a position of trust automatically renders an employee a suspect witness is not reasonable. Such a view conflicts with procedural principles grounded in constitutional guarantees — particularly the right to defense and access to justice.
The Understanding Established by TST Theme No. 307
The Superior Labor Court has now established a precedent that may greatly benefit companies in building their defenses in labor lawsuits, reinforcing the constitutional principles of adversarial proceedings (contraditório) and full defense (ampla defesa).
Corporate environments often view the labor courts with skepticism, due to their protective nature toward employees — the more vulnerable party in the employment relationship. Moreover, companies’ defenses have frequently been limited by the presumption that managerial employees are biased and thus unfit to testify.
However, Theme No. 307 of the TST challenges this dynamic and represents a potential advance in ensuring employers’ access to a fair defense in labor litigation. The leading case, Action No. 0010638-88.2024.5.03.0084, selected as the paradigm for the Superior Labor Court’s ruling, was decided in a judgement published on September 15, 2025, which stated:
[...] The Ministers of the Full Bench of the Superior Labor Court, unanimously, DECIDE:
I – To approve the referral of the case for the establishment of a Repetitive Appeal Incident, in order to reaffirm this Court’s jurisprudence on the matter, fixing the following thesis: Holding a managerial position or position of trust does not, by itself, constitute grounds for suspecting a witness, except when there is a lack of impartiality to testify in the proceedings or when the witness holds managerial and decision-making powers equivalent to those of the employer. II – To hear the special appeal on the representative issue, due to violation of Article 447, §3, II, of the Civil Procedure Code, and, on the merits, to grant it, applying the reaffirmed thesis and remanding the case to the lower court for further examination, taking into account the testimony of the witness presented by the defendant. III – To order the regular continuation of the proceedings, given the absence of remaining matters for this Court to address.
This means that, from now on, Regional Labor Courts must apply the understanding fixed in the TST’s Repetitive Appeals Thesis. Thus, for a managerial employee to be deemed suspect and barred from testifying, it must be clearly demonstrated either that (1) the witness lacks impartiality (i.e., shows evident bias or partiality in favor of the employer), or that (2) the employee holds managerial and decision-making powers comparable to those of the employer — for instance, high-level directors with decision-making autonomy and representational powers equivalent to those of the company’s partners or shareholders.
The establishment of this understanding through the repetitive demand mechanism serves as a way for the TST to ensure uniform application of this interpretation by Regional Labor Courts. The expected impact is positive, strengthening employers’ right to a full defense, as they will no longer face procedural limitations that prevent their managerial employees from testifying. In many cases, such testimony may prove decisive in guiding the judge’s understanding of the facts in dispute. Author:
Rafael da Rocha Chueiri
Associate Attorney
Litigation Department
Learn more at: https://www.bariladvogados.com.br/rafael
References
Consolidation of Labor Laws (CLT). Decree-Law nº 5.452/1943. Available at: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm.
Code of Civil Procedure. Law nº 13.105/2015. Available at: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm.
Constitution of the Federative Republico of Brazil (1988). Available at: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.
Full text of the TST Plenary Rulling. Available at: https://pje.tst.jus.br/consultaprocessual/detalhe-processo/0010638-88.2024.5.03.0084/3#cefed1b.
MARQUEZINI, Ágatha e PIOVESAN, Bruna Maria: TST Decides to Change the Use of Witnesses Holding Positions of Trust. Available at: https://www.conjur.com.br/2025-out-10/tst-decide-alterar-uso-de-testemunhas-em-cargos-de-confianca/ - acesso em 21/10/2025.

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