Por Gabriela Kowalski
De acordo com a Organização Mundial da Propriedade Intelectual – OMPI, o China National Intellectual Property Administration – CNIPA (Órgão Responsável pela proteção da Propriedade Intelectual na China) relatou crescimento de Pedidos de Patente em 2020, chegando à marca de 1,5 milhões de depósitos. Não obstante, a China tem o segundo maior número de Patentes em vigência no mundo, cerca de 3,1 milhões, ficando atrás apenas dos Estados Unidos.
Em 2020, 185 Pedidos de Patente Brasileiros foram depositados em território Chinês, 23 a mais do que em 2019. Neste mesmo biênio, 226 Patentes de origem nacional foram concedidas pelo CNIPA.
Talvez não seja um número expressivo se comparado com os 448 pedidos depositados perante o INPI somente em 2020, pela gigante de equipamentos de telecomunicação chinesa Huawei. Contudo, as alterações na Lei de Patentes chinesa trazem mudanças que podem ser de interesse para depositantes estrangeiros e reforçam a política interna do país na proteção à Propriedade Intelectual.
A chamada “Nova Lei de Patentes” chinesa, promulgada em 17 de outubro de 2020, entrou em vigor no primeiro dia de junho de 2021. A lei original é de 1985, tendo sofrido revisões em 1992, 2000 e 2008. Destacam-se a seguir os principais pontos da versão atual.
Conforme amplamente admitido no direito internacional e também por legislações internas, a novidade é um dos requisitos básicos de proteção de inovações por patentes. Para um pedido de patente ser considerado novo, ele não pode estar abrangido pelo chamado “estado da técnica”. Por sua vez, o “estado da técnica” é constituído por tudo aquilo tornado acessível ao público antes da data de depósito do pedido de patente.
Por sua vez, o “estado da técnica” é constituído por tudo aquilo tornado acessível ao público antes da data de depósito do pedido de patente, ressalvadas algumas especificidades em legislação nacional. Exemplo disso é a legislação brasileira que prescreve que não será considerada como estado da técnica a divulgação de invenção ou modelo de utilidade, quando ocorrida durante os 12 (doze) meses que precederem a data de depósito ou a da prioridade do pedido de patente, se promovida pelo inventor, dentre outras hipóteses.
A antiga legislação chinesa já previa o conceito de “divulgações não prejudicais” da novidade, as quais incluíam exibições interacionais, eventos acadêmicos ou tecnológicos, além de divulgações sem consentimento do titular. No regime atual, caso o titular divulgue sua respectiva inovação numa emergência nacional ou qualquer estado extraordinário de negócios, dentro de um período de um semestre antes da data de depósito do pedido, a divulgação é também classificada como “não prejudicial”. Essa alteração favorece a obtenção de proteção de patentes para tecnologias implementadas no combate à pandemia de COVID-19, por exemplo.
Em termos procedimentais, o art. 15 da nova Lei de Patentes aumenta o período para o ajuntamento de cópias certificadas de documentos de prioridade, de 3 para 6 meses contados da primeira data de prioridade para patentes de invenção e de modelo de utilidade. Para desenhos industriais, o prazo continua sendo de 3 meses.
Novas mudanças também ocorreram para a proteção de desenhos industriais, os quais são objetos de patentes na China, diferentemente do regime brasileiro, onde em que a proteção se dá por registros específicos de desenhos industriais. A nova Lei das Patentes chinesa admite proteção para apenas parte de um desenho, ao passo que, no regime revogado, somente era possível requerer proteção para o design como um todo. Além disso, e em concordância com o Acordo de Haia relativo ao Registro Internacional de Desenhos Industriais, o período de proteção de uma patente de desenho industrial passa de 10 para 15 anos.
Aqueles que pretendem requerer uma patente de desenho industrial possuem agora a prioridade nacional de 6 meses, antes aplicada somente a patentes de invenção e de modelo de utilidade. Ou seja, a fim de remediar erros do primeiro pedido de patente, ou caso este tenha sido considerado arquivado, o novo sistema fornece alternativas para ainda buscar proteção aos respectivos desenhos industriais.
Alterações importantes também ocorreram para o regime de proteção de inovações oriundas da indústria farmacêutica. De acordo com o art. 42 da nova Lei de Patentes, o titular de uma patente relacionada a medicamentos pode requerer compensação por atrasos irrazoáveis no exame de um pedido de patente, que inclui um período de até 5 anos a mais de proteção da patente, desde que a proteção total não exceda 14 anos. Além disso, o art. 76 dispõe aos titulares de patentes um período de 9 meses de suspensão da aprovação de genéricos após reclamação de patente.
A nova lei também promete melhoria nos direitos dos detentores de patentes. O titular, que antes tinha 2 anos, agora possui 3 para iniciar um processo de violação de patente, seja em âmbito judicial ou junto a autoridades administrativas locais.
Na prática, observa-se uma preferência por trâmites junto a autoridades administrativas locais, uma vez que as mesmas são consideradas mais ágeis na adjudicação de disputas, além de uma maior disponibilidade de medidas liminares e outros recursos para a preservação de provas. A legislação em vigor também confere CNIPA e a departamentos administrativos locais maior autoridade para julgar e resolver casos de disputas de patentes.
Para situações de comprovada infração de patentes, mas sem a clara demonstração de danos materiais, o art. 71 (2) da nova Lei estabelece danos presumidos de 30.000 a 5.000.000 RMB (Renminbi, moeda local). O art. 71 (1) introduz o conceito de “danos punitivos”, o qual já está presente em outras jurisdições, como a estadunidense, por exemplo.
Por fim, para uma maior proteção de patentes contra os “PAEs” (Patent Assertion Entity), popularmente conhecidos como “trolls de patentes”, os arts. 50 a 52 deixam opcional ao titular da patente notificar o CNIPA a intenção de licenciamento aberto, através de uma declaração escrita contendo os custos e forma de pagamento. Para patentes de modelo de utilidade ou de desenho industrial, é necessário um relatório de avaliação. Nenhuma licença única ou exclusiva deve ser aprovada enquanto durar o período de licença aberta.
Licenciamentos abertos facilitam a constituição de redes defensivas compartilhadas, como a LOTNET, uma organização sem fins lucrativos criada para combater os trolls de patentes. Grandes empresas chinesas como a DJI, Alibaba e Xiaomi, já participam da LOTNET. Caso um membro dessas redes venda ou transferira os direitos de uma patente a um PAE, os restantes recebem uma licença que busca resguardá-los contra qualquer ação judicial por parte do troll de patentes. A lei encoraja as partes envolvidas a resolver potenciais disputas através de negociações, da mediação do CNIPA ou, caso as anteriores não sejam suficientes, por um tribunal.
Gabriela Kowalski é estudante de Relações Internacionais e estagiária no setor de Controladoria Internacional da Baril Advogados. Presta assistência no controle de prazos e processos de Propriedade Intelectual no exterior, especialmente marcas, patentes e desenhos industriais. É responsável também por pesquisas sobre desenvolvimentos da legislação estrangeira e internacional na matéria.
Referências:
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